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3566012 | RITUAIS DE CUIDADO DESENVOLVIDOS PELAS FAMÍLIAS DURANTE O PROCESSO GESTACIONAL | Autores: Laís Antunes Wilhelm ; Lisie Alende Prates ; Luiza Cremonese ; Gabriela Oliveira |
Resumo: **Introdução:** o processo gestacional constitui-se em uma experiência ímpar, complexa, dinâmica e transformadora tanto para a mulher quanto para a sua família. Representa um período marcado por intensas transformações, adaptações, aprendizados e incertezas, as quais são acompanhadas por mudanças de papéis, ou aquisição de novas responsabilidades, que visam à reorganização da nova estrutura familiar nos níveis afetivo, econômico e social. Mais do que um período caracterizado por transformações físicas no corpo da mulher, o processo gestacional envolve um evento social familiar, no qual estão imbricados aspectos emocionais, espirituais, psicológicos, históricos e socioculturais, que podem gerar repercussões nos sentimentos, na constituição familiar e na formação de laços afetivos. O processo gestacional consiste em um marco no ciclo do desenvolvimento da família, pois representa a sua expansão e implica em mudanças nas expectativas, planos e projetos dos membros da família. Portanto, o processo gestacional envolve um período de transição na vida da mulher, mas também de sua família, pois representa um fenômeno que provoca inúmeras mudanças no contexto familiar. Nessa perspectiva, a família pode ser entendida como o grupo social mais importante e significativo, pois é responsável pelo cuidado e atendimento às necessidades básicas de seus membros, além da propagação de valores, crenças, tradições e costumes entre as gerações. Durante o processo gestacional, a família pode representar uma das principais fontes de apoio, proteção e orientação à gestante. Para desempenhar esses papéis, no processo gestacional, a família habitualmente desenvolve alguns ritos (ou rituais), os quais representam atos ou cerimônias que têm como propósito auxiliar o indivíduo a transpor uma situação determinada. Assim, o processo gestacional constitui-se em um ritual de transição, que pode ser percebido e vivido de acordo com cada cultura familiar. **Objetivo:** conhecer os rituais de cuidado desenvolvidos pelas famílias durante o processo gestacional. **Descrição metodológica: **pesquisa etnográfica, desenvolvida com três famílias, durante a vivência do processo gestacional. A pesquisa envolveu dois tipos de informantes, os informantes-chave, que foram seis e os informantes gerais, que foram cinco. Foi realizada em um município da região central do estado do Rio Grande do Sul, durante o ano de 2016. Adotou-se o modelo de Observação-Participação-Reflexão. A análise fundamentou-se na análise de dados da etnoenfermagem. Foram respeitados os dispositivos legais da Resolução do Conselho Nacional de Saúde de nº 466/2012. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, sob o CAAE 53928116.6.0000.5346. **Resultados: **a revelação da gestação ao companheiro e à família inaugura o desenvolvimento dos rituais, pois para que a mulher e os demais familiares possam passar pela transição de status e papeis sociais, e também para que o bebê seja agregado à estrutura familiar, são necessários rituais de revelação deste evento, que inicialmente são praticados exclusivamente pela mulher, mas que, na sequência, são compartilhados e desenvolvidos, em conjunto, pela família. Frente à revelação, a família pode iniciar o seu ritual de transição, que ocorre de maneira gradual. A mulher, gradativamente, se percebe como “mãe” ao ver o corpo se transformando e perceber as suas necessidades e do bebê revelando a necessidade de rituais de cuidado relativas à alimentação e à redução do esforço físico; a figura paterna vai se manifestando, aos poucos, diante dos rituais de cuidado desenvolvidos pelo companheiro ao se inserir nas ações de acompanhamento pré-natal e nos preparativos para a chegada do bebê; e o filho, nas famílias multíparas, foi convidado e estimulado a participar desse processo, nas consultas de pré-natal, nas ultrassonografias e nos demais rituais de cuidado desenvolvidos pelos indivíduos da rede de apoio social, contribuindo, assim, para a sua passagem de filho para irmão. O próprio bebê também vivencia essa transição, a partir dos rituais de cuidado desenvolvidos pela família, que o auxiliam a integrar-se à cultura da qual ele fará parte. Nesse contexto, essa estrutura assume a condição de família grávida, que, ao longo desse período transicional, precisa desenvolver rituais de cuidado para proteger a saúde materno-infantil e preparar o corpo, a mente, o ambiente domiciliar e a própria estrutura familiar para a chegada do novo ser. Por conseguinte, os rituais de cuidado envolveram a revelação da gestação, a alimentação, a utilização de homeopatia e chás, além da reorganização da família, a preparação do quarto do bebê, as vestimentas do bebê, o chá de fraldas, as escolhas futuras da criança, o apadrinhamento e o registro da gestação por meio de álbuns. Todos esses rituais emergiram na rotina, fazendo com que os indivíduos se aproximem, fortalecessem a cultura e renovassem os elementos que englobavam as crenças familiares. **Conclusão:** os rituais de cuidado constituem elementos culturais essenciais para o cuidado à saúde da família grávida. Eles integram os familiares, mantém a sua identidade, fortalecem a cultura familiar e renovam os elementos que compõem a família. Assim, ratifica-se a importância dos rituais de cuidado, na formação profissional em Enfermagem, pois estes permitem analisar o comportamento dos indivíduos em relação ao corpo, à saúde, à doença, à vida e à morte, em qualquer grupo ou comunidade. Logo, torna-se fundamental a valorização e a compreensão do contexto sociocultural em que se desenvolve a gestação, para o fornecimento de cuidados culturalmente congruentes. É preciso resgatar a cultura para o cerne da relação entre indivíduo e profissional de saúde, valorizando as práticas populares, e no caso deste estudo os rituais de cuidado, dentro de seu contexto. O profissional de saúde e, em especial, o enfermeiro precisa incorporar em suas ações de atenção, perspectivas e atitudes que contemplem as subjetividades, especificidades e singularidades de cada família envolvida no processo gestacional, buscando, assim, a interface da cultura ao cuidado prestado. Salienta-se que não se pretende desconsiderar o conhecimento científico e profissional, mas agregar as contribuições dos saberes populares, folk e profissionais, durante o processo gestacional, considerando que as crenças, valores, experiências e visões de mundo podem refletir nos comportamentos e hábitos de vida dos indivíduos. O enfermeiro precisa visualizar além de sua própria cultura, ampliando seu olhar à mulher, sua família e seu contexto de vida, focalizando a diversidade cultural que permeia o cuidado. É preciso reconhecer que os indivíduos agem e reagem influenciados por herança cultural, balizadas na interpretação que fazem de suas vivências. Por isso, infere-se que é possível agregar as práticas de cuidado dos profissionais de saúde aos rituais de cuidado desenvolvidos pelas famílias, a partir do exercício da escuta, da valorização do ambiente familiar e do seu saber e, principalmente, do envolvimento dos indivíduos que vivenciam a gestação. Pondera-se que estas estratégias são capazes de contribuir para a mudança do modelo de cuidado à saúde vigente.
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