Comunicação coordenada
146 | PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL EM ENFERMAGEM NO COTIDIANO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE | Autores: Heloiza Maria Siqueira Rennó (Universidade Federal de São João del Rei) ; Flávia Regina Souza Ramos (Universidade Federal de Santa Catarina) ; Carolina da Silva Caram (Universidade Federal de Minas Gerais) ; Lilian Cristina Rezende (Universidade Federal de Minas Gerais) ; Maria José Menezes Brito (Universidade Federal de Minas Gerais) |
Resumo: PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL EM ENFERMAGEM NO COTIDIANO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE Heloisa Maria Siqueira Rennó , Flávia Regina Souza Ramos , Carolina da Silva Caram , Lilian Cristina Rezende , Maria José Menezes Brito . A socialização profissional é um tipo de socialização secundária formadora da identidade do indivíduo1, sendo ela a interiorização de submundos institucionais e especializados, compreendendo a aquisição de papéis na divisão do trabalho, que envolvem um universo simbólico que veicula uma concepção de mundo. O processo de socialização profissional incorpora diferente nuances do âmbito social, político e pedagógico que interagem entre si e contribuem para o desenvolvimento de competências ético-morais dos profissionais. No que diz respeito a enfermagem, a socialização profissional extrapola o espaço da universidade, devendo alcançar a realidade do trabalho e da gestão em saúde. Pela característica da profissão, os estudantes vivenciam durante o processo de formação, diversos problemas morais ligados às questões didático-pedagógicas e práticas nos serviços de saúde, principalmente, no estágio curricular do último ano do curso, momento em que o estudante se depara com problemas do cotidiano do Sistema Único de Saúde, SUS, de forma intensa. O estudante vivencia no estágio curricular problemas do âmbito assistencial e gerencial, que demandam escolhas, estabelecimento de prioridades, tomada de decisão e mediação de conflitos. Nesta direção, a formação em Enfermagem deve propiciar ao estudante o conhecimento das necessidades de saúde da sociedade na qual se insere, bem como a compreensão da complexidade das ações que envolvem os enfermeiros, objetivando a melhoria da assistência à saúde e contribuindo para sua formação2. Dessa forma, é fundamental que o aluno vivencie experiências de integração ensino-serviço, haja vista que a inserção dos estudantes em cenários reais de cuidado é importante para agregar sentido prático aos conhecimentos teóricos. Entretanto, apesar das inegáveis contribuições das experiências de integração ensino-serviço na graduação em Enfermagem, existem fatores que podem interferir no processo de socialização profissional. Dentre estes fatores, são destacados os aspectos organizacionais dos cursos e da rotina das instituições de saúde3, bem como relacionados aos modelos de gestão dos serviços de saúde, que têm exigido a mobilização de competências e habilidades diferenciadas dos profissionais, como a capacidade de articulação entre os setores, flexibilidade, multifuncionalidade e capacidade de relacionar-se com a equipe. Diante do exposto o objetivo deste estudo foi compreender o processo de socialização profissional em enfermagem de estudantes por meio de vivências de problemas ético-morais nos estágios curriculares do último período do curso. Trata-se de um Estudo de Caso Múltiplo de abordagem qualitativa realizado em duas Instituições de Ensino Superior Federal no Brasil. Os participantes foram 58 estudantes do curso de graduação em enfermagem que estavam cursando o estágio curricular do último período do curso nos diversos níveis de atenção à saúde vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A coleta de dados foi realizada por meio de oito grupos focais, no ano de 2015, os quais que foram gravados e transcritos na íntegra. Os dados foram submetidos à Análise Temática de Conteúdo de Bardin4 com auxílio do software ATLAS ti. Os resultados apontaram que o processo de socialização profissional em enfermagem é influenciado por vivências de problemas ético-morais nos serviços de saúde que compõem o SUS. Os resultados foram agrupados em cinco categorias empíricas, são elas: "Falta de comprometimento de professores, profissionais e gestores"; "Fragilidades estruturais dos serviços"; "Dicotomia entre a teoria e prática"; "Erro profissional" e; "Cumprimento de metas". Foi evidenciado pelos participantes deste estudo que a "Falta de comprometimento dos professores, profissionais e gestores" influencia negativamente na preparação dos futuros enfermeiros no que diz respeito à reflexão das doutrinas éticas e morais, o que não contribui para que os estudantes sejam capazes de exercer a cidadania e tomar decisão em contextos permeados por conflitos e dilemas éticos. No que concerne às "Fragilidades estruturais", foi possível perceber, nos serviços de saúde em que os estudantes realizam o estágio, a precariedade das condições físicas, materiais, humanas e gerenciais, as quais comprometem a formação. A "Dicotomia entre a teoria e prática" evidenciou fragilidades relacionadas à fragmentação teórico-prática na dimensão ética do cuidado, destacando-se o distanciamento entre o que é teoricamente enfatizado na universidade e o que é vivido na prática cotidiana, causando conflitos nos estudantes no que se refere a conduta a seguir. Já a categoria "Erro profissional" destacou situações em que os estudantes se depararam com erros de condutas dos profissionais, foram pressionados a aceitar as situações e calar-se para manter as oportunidades de aprendizagem e o campo de estágio. Por fim, a categoria "Cumprimento de metas" apontou que os estudantes observaram que os profissionais do serviço se preocupam com resultado do trabalho expresso em números de atendimento para cumprir as metas exigidas pela gestão em detrimento da excelência da assistência prestada, causando reflexões importantes no que concerne a qualidade do cuidado. Os estudantes apontam ainda a vivência de outros problemas no cotidiano do SUS como os problemas morais que envolvem a gestão dos serviços de saúde; os conflitos entre a equipe multiprofissional, principalmente referente à hegemonia médica e à desvalorização do saber da enfermagem. Foi possível perceber que os estudantes almejam serem profissionais diferenciados, com posturas críticas e éticas baseadas na valorização da humanização e em evidências científicas. Para tal, exige-se esforços, por parte dos docentes para que explorem as potencialidades de enfrentamento dos problemas ético-morais pelos estudantes, durante o processo de socialização profissional em enfermagem. Neste contexto, considera-se que os problemas presentes no SUS, reforçam as necessidades de mudanças no processo de formação e o desenvolvimento de competências ético-morais dos estudantes de enfermagem. Os estudantes devem ser preparados para a flexibilidade de saberes e técnicas, para modelos profissionais dinâmicos, para o exercício da autonomia e para o aprendizado permanente de conteúdos e novas habilidades. Portanto, a socialização profissional na Graduação em Enfermagem deve atender ao prescrito nas políticas de formação em Enfermagem, bem como na realidade cotidiana do trabalho nos serviços de saúde, sendo importante que as diretrizes e políticas de formação sejam constantemente revisadas e atualizadas. Logo, destaca-se que a formação em Enfermagem demanda um ensino que proporcione uma educação moral, enfocando a formação humana ampliada, visando competências genéricas e voltada para relações humanas complexas, que englobem as dimensões ético-morais de valores e sentimentos. Por meio da socialização profissional, os estudantes de enfermagem devem aprender a lidar com conflitos e situações que lhe são impostas no cotidiano do SUS. Palavras-chave: Enfermagem. Ética. Socialização. Referências 1 Dubar C. A crise das identidades: A interpretação de uma mutação. Tradução de Mary Amazonas leite de barros. São Paulo: Editora da universidade de São Paulo. 2009. 292p. 2 Brehmer LCF, Ramos FRS. Experiências de integração ensino-serviço no processo de formação profissional em saúde: revisão integrativa. Revista Eletrônica em Enfermagem, 16(1): 228-237, jan./mar. 2014. 3 Meira MDD, Kurcgant P. O desenvolvimento de competências ético-políticas segundo egressos de um curso de graduação em enfermagem. Revista da Escola de Enfermagem da USP, 47 (5): 1211-1218, 2013. 4 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011. |