Comunicação coordenada
46 | A formação do enfermeiro e a historicidade dos traços identitários nos Projetos Político-Pedagógicos | Autores: Alexandro do Vale Silva (Universidade Federal do Ceará - UFC) ; Maria Socorro de Araújo Dias (Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA) ; Lucilane Maria Sales da Silva (Universidade Estadual do Ceará - UECE) ; Maria Adelane Monteiro da Silva (Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA) |
Resumo: A identidade profissional do enfermeiro foi e vem sendo construída desde a formação a partir de vários aspectos, entre eles a relação da área com a sociedade em termos de seu papel assistencial, gerencial, educativo, científico, social e político1. Acredita-se que as mesmas não são nem expressões psicológicas de personalidades individuais nem produtos de estruturas ou de políticas impostas de cima, mas sim construções sociais que implicam a interação entre trajetórias individuais e sistema de emprego, de trabalho e de formação2. É na interseção desses três campos que se define a identidade profissional. O estudo objetivou analisar aspectos históricos formativos da identidade profissional do enfermeiro evidenciada nos Projetos Político-pedagógicos (PPP). Trata-se de um estudo documental, exploratório e descritivo de abordagem qualitativa. Foi composto de uma análise documental dos PPP de cinco regiões do país e analisados sob a luz da hermenêutica-dialética. O estudo evidenciou três padrões de razões para a criação dos cursos de enfermagem: I) formação de profissionais enfermeiros que atendessem às necessidades gerais de mercado regional; II) resposta ao requerimento institucional de expansão nacional das escolas de nível superior de enfermagem; e, III) atendimento a um setor da sociedade com características singulares. O perfil das IES estudadas revelou que estas apresentam um projeto institucional consolidado com uma média de 31 anos de atuação na formação de enfermeiros. Destas apenas duas universidades operavam há menos de dez anos, o que representa uma relativa maturidade nos processos de formação profissional. Observamos também que os cursos de graduação em enfermagem estudados foram criados sob três momentos históricos distintos. O curso mais antigo remonta da década de 1940 do século XX, e surge em um período que a atenção à saúde é baseada em atividades sanitárias básicas. Já duas IES têm seus cursos criados na segunda metade da década de 1970, período em que a assistência à saúde era prestada por meio do Sistema Nacional de Assistência e Previdência Social (SINPAS)3. Desse modo, o Modelo Médico Hegemônico em vigor nesses dois períodos históricos privilegiava: a historicidade da prática médica, o biologicismo, a prática médica curativa, a medicalização, dentre outros. Isso nos leva a crer que essas três IES tiveram seus cursos de graduação em enfermagem criados sob um contexto histórico em que os profissionais formados para atuação em um modelo de assistência à saúde que privilegiava a assistência biomédica, curativa, hospitalocêntrica e individual. Os cursos de enfermagem tiveram durante muito tempo esse parâmetro ancorando seus currículos, o que por vezes, ainda pode estar ocorrendo, como ilustra esse trecho de um dos PPP analisados: No que tange aos currículos dos Cursos de Enfermagem, por muito tempo tiveram como parâmetro o Modelo Nightingaleano, o que permanece, muitas vezes influenciando os currículos na atualidade (IES ENF1). Duas outras IES tiveram suas escolas criadas na primeira década de 2000 em um período de transformações como a modificação do perfil demográfico, epidemiológicas e sociais, cenário que passa a exigir um sistema de saúde que atenda as novas necessidades da população, num período de redemocratização do acesso ao sistema de saúde através da implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) como legado da reforma sanitária. Essas duas IES tiveram seus cursos de enfermagem criados já sob os parâmetros dos princípios preconizados pelo SUS, o que necessariamente não remete que a identidade profissional dos enfermeiros formados por tais instituições coadune perfeitamente com esse modelo de atenção à saúde. Haja vista que a construção da identidade profissional é determinada por uma série de fatores que interagem e resultam nas características delineadoras de um coletivo. Entretanto, consideramos que os elementos orientadores da criação dos cursos de enfermagem, balizam e podem continuar influenciando os currículos da atualidade. O conhecimento acerca do contexto histórico de surgimento das escolas de enfermagem como forma compreensão dos modelos de formação superior aplicados nos recônditos escolares e o perfil de enfermeiros que se está se formando. A enfermagem precisa compreender que esses percursos históricos definem o espaço dominado pela categoria e é pela via da formação e sua certificação que se reclama um suporte legal, outorgado pelo Estado, que delimite e consagre a exclusividade do exercício da enfermagem. O autor também declara que as escolas assumem um papel de primeira ordem no que diz respeito à construção de identidades profissionais e à construção de monopólios acadêmicos ou científicos do grupo. Assim, o conhecimento do passado da enfermagem, constitui uma ferramenta indispensável ao desenvolvimento da profissão, não somente para avaliação das trajetórias históricas ou reconhecimento de transformações simbólicas, mas como legitimação da prática e das potencialidades inerentes ao exercício profissional4. O estudo das instituições educacionais constitui um importante eixo de análise que pode permitir uma compreensão alargada sobre, por exemplo, os universos profissionais e/ou os mecanismos encontrados para o desenvolvimento profissional de um determinado grupo em emergência. Levando em consideração que a sociedade se comporta de forma orgânica, apresentando uma dinamicidade nos âmbitos demográfico, ambiental, epidemiológico e social, inferimos que os modelos de formação em saúde, particularmente da enfermagem, devem estar atentos a essas mudanças contextuais, e aproximar seus currículos para o atendimento das demandas do mercado. As discussões sobre as necessidades de rever a formação do enfermeiro, levando em consideração os preceitos preconizados pela LDB, as DCN e as necessidades de cada região, devem sistematicamente ser realizadas com vistas ao desenvolvimento de processos formativos condizentes ao atendimento das necessidades de saúde da população. Com efeito, estudos apontam5 ainda uma deficiência na formação dos profissionais de saúde, ainda muito centrada em práticas curativas e hospitalares, com consequente dificuldade de desenvolvimento de práticas mais integrais e resolutivas de cuidado, incluindo a capacidade de trabalhar em equipe, implementar atividades de promoção e prevenção em saúde e ter uma postura mais ética e cuidadora dos usuários do SUS. A falta de coordenação e sintonia entre sistema de formação de recursos humanos no país e as necessidades epidemiológicas e de atenção à população, sentida nos serviços de saúde, constitui em uma das problemáticas mais urgentes a ser enfrentadas para o bom funcionamento do sistema de saúde brasileiro contemporâneo. Assim sendo, compreendemos que os PPP precisam ser fluidos, contemporâneos e alinhados aos novos perfis sociodemográficos, para que a identidade profissional do enfermeiro esteja consonante com o atendimento das reais necessidades da população. O enfermeiro precisa compreender de que o conhecimento sobre o processo histórico da enfermagem é importante para balizar suas concepções e consequentemente sua identidade profissional. |