Roda de Conversa
3 | SONHAR, (RE)APRENDER E ENSINAR: UMA ANALOGIA ENTRE A FORMAÇÃO EM ENFERMAGEM E A MÍSTICA DA HISTÓRIA DE PETER PAN NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE | Autores: Carine Vendruscolo (Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)) ; Denise Antunes de Azambuja Zocche (Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)) ; André Lucas Maffissoni (Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)) ; Jean Wilian Bender (Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)) |
Resumo: Introdução: O trabalho em saúde, sobretudo na roda do dia-a-dia que permeia a atenção primária em saúde, gera movimentos que fazem sentido na construção do nosso ser "humano" profissional. São os encontros da vida, do/no ensino e do/no trabalho em saúde que nos possibilitam reflexões a fim de compreendermos a Educação Permanente em Saúde (EPS) como ferramenta de transformação de todos esses atores e, por conseguinte, dos mundos/cenários, nos quais se produz saúde. Trata-se de uma realidade em constante movimento e transformação, repleta de diferentes histórias. Nessa direção, os processos educativos são dispositivos importantes e que acompanham o trabalho em enfermagem, desde a graduação até a prática profissional. É sobre esses encontros e movimentos que trata essa narrativa. É ponto pacífico que o Sistema de Saúde que desejamos deve priorizar o encontro, a necessidade do outro. Isso está relacionado com um processo de (re)construção permanente, em que os atores implicados não se constituem em seus núcleos de atenção à saúde, mas na integração e interação e, nesse processo, nada e ninguém se constrói isoladamente. Logo, aproximar e envolver os atores que são protagonistas dos movimentos de produção da saúde é fundamental! Objetivo: O presente relato expõe a trajetória do Grupo de Estudos sobre Formação e Educação em Saúde do Departamento de Enfermagem da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e objetiva provocar reflexões sobre esse movimento de construção coletiva, no contexto da EPS. Descrição Metodológica: Nos propomos nesse trabalho a utilizar a cartografia como delineamento metodológico para narrar nossas experiências e reflexões diante das potencialidades da EPS no ensino, no serviço, na gestão e na vida. A cartografia foi escolhida por ter uma aproximação maior da produção de saberes oriunda dos processos de subjetivação, sendo útil para descrever os processos mais do estado de coisa1. Foram tecidas articulações com a história de Peter Pan, a fim de fazer refletir sobre a EPS como uma possibilidade de integração e transformação dos e nos mundos: realidade e sonho; o Sistema Único de Saúde (SUS) que temos e o SUS que queremos; o ensino e o serviço em saúde; o tempo real e o tempo subjetivo. Peter Pan era um menino que não queria crescer. Ele desejava permanecer na "Terra do Nunca", onde é permitido viver no sonho, na utopia. Um lugar onde nada é planejado e tudo é surpreendentemente, bom! Um dia Peter perdeu a sua sombra, então, ele conheceu uma menina chamada Wendy que costurou a sombra em Peter novamente, ajudando-o a compreender que ele não deve viver descolado do mundo real, mas que, por outro lado, o sonho sempre acompanha a realidade. Utilizando-se da metáfora, a partir desse conto de fadas, pensamos no processo educativo como um dispositivo que implica na construção do ser histórico, vivendo num tempo/espaço e com possibilidades reais de atuar/modificar os momentos históricos. Contudo, ainda que tenha que tomar consciência das suas possibilidades reais, não pode perder de vista o sonho, como uma possibilidade inédita, mas viável2. Resultados: Ao atuar como um radar, captamos, afetamos e nos deixamos afetar pelos encontros da vida3. Uma das experiências que nos toca e motiva a seguir a caminhada, em busca do sonho no contexto do ensino, o qual Paulo Freire denominava "inédito viável", foi o "Grupo de Estudos sobre Educação e Formação em Saúde". O grupo (ou subgrupo) está articulado a um dos Grupos de Pesquisa da Enfermagem da UDESC. Formado por estudantes e professores da graduação em Enfermagem, se alimenta de um desejo coletivo: pensar e trocar saberes sobre o ideário da EPS. Nesse espaço se descobre o sonho possível ou o inédito viável, motivados pela possibilidade de consolidar um Sistema de Saúde de qualidade, por meio das ações educativas, apesar de todos os problemas que acompanham essa construção. Os estudos no grupo iniciaram em 2015, resgatando a história dos profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS). Fica mais lógico compreender, amar e respeitar algo, quando nos entendemos como parte da sua construção e que todos nós fazemos sua história. As atividades do grupo de estudos da Enfermagem UDESC pressupõem a interação constante entre os membros. Dispostos em forma de roda, os estudantes e professores são convidados a narrar histórias e refletir sobre elas a partir da troca com os colegas e do apoio dos referenciais teórico-filosóficos que sustentam a EPS e o SUS. A produção do grupo, seja em trabalhos de natureza científica, extensão ou na integração com o serviço em atividades práticas, são mediadas pela da práxis - processo ação com reflexão que se fundamenta no compromisso com a transformação social4. Os encontros acontecem quinzenalmente, nas dependências do Curso de Enfermagem da UDESC e as práticas pedagógicas pressupõem a prática reflexiva dos estudantes, a partir de vivências de pesquisa e extensão. Frente a esta experiência, percebeu-se ao longo dos encontros um novo movimento: o encontro da educação com a saúde, em especial com a profissão enfermagem. Alguns relatos e reflexões causaram inquietações: Como a enfermagem vem consolidando os princípios do SUS em sua prática? O que estamos fazendo para garantir um SUS com serviços efetivos, nas práticas de ensino, de pesquisa, na assistência, na sala de aula, nos serviços de saúde? Quais são nossas funções enquanto educadores, profissionais da saúde e estudantes? Somos (ou seremos) profissionais especializados em cuidar, em gerir o cuidado, em planejar o cuidado? O trabalho coletivo do grupo tornou-se lócus da produção do conhecimento por meio do diálogo, criando bases para o respeito mútuo entre os seus componentes, para a amorosidade e para o encontro entre os seres e suas diversas singularidades. Conclusão: Acredita-se que o nosso Peter Pan está no caminho de encontrar sua sombra. Utilizando-se dessa simbologia, podemos supor, entretanto, que na trajetória do grupo de estudos, há muitas arestas a serem ajustadas, muitas costuras a serem realizadas em relação a esses espaços de aprendizado e de democracia, nos processos dialógicos que se direcionam a consolidação da EPS e do SUS. Implicações para a Enfermagem: Muitos questionamentos nos levam a rever o que a enfermagem representa para a atenção em saúde e qual seu lugar no SUS. O processo de formação do grupo apresentou um novo modo de olhar para o ensino em saúde, semeando a vontade de compreender a maneira com que se formam os profissionais desta área e, sobretudo, da Enfermagem, o modo com que essa formação implica no trabalho e os aspectos e paradigmas que envolvem o mundo do ensino em saúde. Referências: 1. Deleuze G. Espinosa: Filosofia Pratica. São Paulo: Escuta, 2002; 2. EPS em Movimento. Entrada, Apresentação. 2014. Disponível em: . Acesso em: 05 set. 2015; 3. Freire P. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998; 4. Freire P. Pedagogia do oprimido. 41. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005. |